4 da manha... acordei nao com o som do despertador mas com o som de uma chuva torrencial e uma forte trovoada. As nuvens que no dia anterior ameaçavam largar a sua carga, tinham passado da ameaça à acçao, e chovia com muita força. Descer ou nao descer? Essa era a nossa questao, pois com uma chuvada daquelas, fazer 9 milhas a descer nao eram o plano ideal... esperámos um pouco, tentámos contactar a estaçao dos rangers e... decidimos descer.
A minha mochila ia cheia, uma garrafa de 4 litros de uma bebida energética, dois cantis de litro com, tenda, saco de dormir, poncho, comida, camara fotográfica e baterias, uma muda de roupa... estava pesada, já a sentia pesada e nem sabia o quanto me ia pesar nas horas seguintes.
O início |
Chegados à estalagem, ponto de início do Bright Angel Trail, aquele trilho que íamos fazer, encontrámos um ranger que se preparava para descer. Isso, um outro grupo que descia e o tempo, que já só estava nublado, aliviou-nos um pouco.
Desde o topo olhávamos para baixo e apenas discerníamos o caminho. sem pontos de referência, ainda com alguma falta de luz, nao víamos muito bem qual seria o nosso destino. Víamos sim que ia ser um trajecto duro.
Respirando fundo para começar a descida... |
Os guias e o sistema de parques recomendam que se saia antes do nascer do sol, se façam duas paragens nas pequenas casas de apoio antes de Indian Gardens e passar as horas mais quentes em Indian Gardens. Há assim 3 tramos, de perto de 2000 metros cada um, que descem mais de 300 metros cada. A inclinaçao é notável... Assim, com amior ou menor dificuldade lá fomos descendo, fazendo as paragens recomendadas, bebendo muita água e comendo umas guloseimas de vez em quando, para manter as energias. A mochila, essa, pesava cada vez mais à medida que as horas passavam. As nuvens desapareciam e o sol começava a dar sinal de vida, torrando-nos a pele literalmente.
Com Indian Gardens ao fundo |
Os ziguezagues do caminho |
Mulas |
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Finalmente, e já cansados e bem suados, chegámos a Indian Gardens, um verdadeiro oásis no meio do canyon. Possui um pequeno curso de água e muita vegetaçao. Até há uns anos, os indígenas possuiam aqui plantaçoes que asseguravam a sua subsistência.
Lá em cima, ao fundo, onde tudo tinha começado... |
Lagarto fêmea... pessoalmente até lhe vejo um olhar feminino :) |
O sol já ia alto, a temperatura elevada, e procurámos uma sombra onde pousar as coisas e nos estendermos ao comprido, eventualmente batendo uma soneca. A esta hora, tudo e todos estavam mais quietos devido ao calor, incluindo estes simpáticos roedores que me olhavam sem sequer se mover.
E como onde há um riacho há pequenas represas, encontrámos uma, onde pelo menos os pés ficaram de molho. Pelo menos os meus já doíam e tinha umas quantas bolhas que me entretive a drenar com o canivete. Enquanto a companheira dormitava, eu decidi ir dar uma visa de olhos pelo oásis. Um pequeno parque de campismo, estaçao de rangers, várias "casotas" cobertas para as pessoas se poderem abrigar do sol e uma pequena biblioteca com livros sobre fauna, flora, história, geologia do canyon... é uma forma de manterem as pessoas quietas nas horas de maior calor, pois ao fim de umas horas torna-se desesperante estar num local tao pequeno e com pouco que fazer. Encontrei uma belíssima receita que terei que experimentar algum dia, para além de sinais de aviso. Digo, começa-se a descer o canyon com dúvidas e com medo, tal é o medo que nos incutem. E depois da minha experiência posso dizer que descer e, sobretudo, subir o canyon, é uma tarefa que nao pode qualquer um. É perigoso, pessoas morrem ou necessitam de assistência.
Refrescando os pés |
A receita |
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Finalmente, ao fim de mais de uma hora de espera a chuva começou a atenuar e nós decidimos sair. Se íamos descer, melhor descer nesse momento, pois no canyon anoitece cedo, e descer com chuva e sem muita luz nao seria decerto a coisa mais inteligente e fácil de fazer. Postos os ponchos sobre as mochilas e corpos, começámos a descer.
Em pontos onde normalmente se podia cruzar sem nenhum problema, tinhamos pequenos regatos com um caudal apreciável. Lembro-me de ter passado cinco e os ter atravessado relativamente incólume, mas a minha companheira molhou a meia em 3 de 5 :)
Depois de Indian Garden caminha-se algum tempo num planalto, ou algo parecido, até se chegar a uma abertura entre duas rochas e se ver outro vale... um vale em que se desce em ziguezagues, que recebeu o nome de Devils Corkscrew (o saca rolhas do diabo), tal a sua sinuosidade. A distância em linha recta nao é muita, mas tendo em conta os desvios multiplica-se por muitas vezes a original.
Devils Corkscrew |
Depois de descido o vale e de termos passado por uma área de derrocada (confesso que fiquei algo nervoso), chegámos finalmente (?) ao Rio Colorado, o famoso Rio. A distância até ao parque de campismo nao era muita e, segundo o guia, o desnível também nao. O que se esqueceram de dizer é que o desnível geral nao muda, pois ainda se sobe e desce bastante! Nesta altura já estava ensopado, um misto de suor e chuva, e ter que fazer o caminho que faltava revelou-se uma tormenta. Já só queria deixar tudo e estender-me a dormir.
Ao longe começava-se a ver a ponte que nos ajudaria a cruzar o rio. Grata visao, pena foi que demorássemos tanto a chegar lá... mas já sabíamos que pouco depois íamos ter um sítio onde descansar!
Finalmente chegámos ao parque de campismo. Escolhemos o sítio onde montar a tenda, e comemos algo finalmente protegidos da humidade que continuava a cair. Como ainda era cedo, e no dia a seguir nao íamos ter tempo para visitar a área, decidimos sair a explorar. Perto, Phantom Ranch, uma área onde se encontram algumas cabanas que se podem alugar, a estaçao de rangers e os currais das mulas. E ainda um pequeno bar onde serviam cerveja... pena que quando lá chegámos ainda estivesse fechado...
Phantom Ranch encontra-se na junçao das mais importantes rotas do Gran Canyon, havendo duas pontes e ainda uma pequena praia onde quem desce o rio de barco pára. Nessa mesma praia decidi refrescar os pés nas águas do Colorado. É proibido nadar, seja pelas fortes correntes e remoínhos, seja pelas temperaturas gélidas das águas. E quando digo gélidas, digo-o literalmente, a água estava gelada e para fazer a fotografia foi um suplício!
Formigas de fogo... mordem :) |
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Vista a área, e até porque já começava a escurecer, fomos buscar as lanternas e gastar os 5 dólares mais bem gastos numa cervejinha bem fresca... estava uma noite linda, de lua cheia, e nem era necessária luz... de dia ou de noite, este é sem dúvida alguma um local mágico...
Depois da minha mais recente viagem ao Brasil, onde esteve incluído um trekking de dois dias na Chapada Diamantina, acredita que compreendo o que custam as subidas e descidas e o peso de uma grande, e cheia, mochila às costas... mas vale bem a pena! Não é verdade? :)
ResponderEliminarQue lindo, Tiago... Obrigada por partilhares estes momentos connosco, com quem gosta de ti. Beijinhos, amigo!
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